"Demônio da Pinacoteca", "Bahia Submersa" e "O Olho e a Tinta", de J.P Schwenck
“Demônio da Pinacoteca"
Tombem-se diálogos
Pinel dos mesários
Fúria dos diáconos
Desordem de templários.
Trava essa cantiga na língua dos sapos
Canta esse problema no umbigo dos sábados
Arranque essa cabeça, sucumba aos fiapos
Garanta seu recheio, tombe os vãos mercados
Degrade essa pinágora, renasça do avesso
Resguarde seu direito, pinte o seu devaneio
Lance sua espada, rogue a cada tropeço
Regue seu quebranto, padeça no seio.
Da vida, engula o pedaço
De modo tenro e retraído, puxe o pecado
Do bico da espada, retalhe o recado
Da carne, perfure o espaço.
Perfume das rosas negras e melódicas pétalas
Acalentam prosódicas promessas
Acanham retóricas ácidas
Fantasmas dos rios e dos ratos.
Coagula-se o sangue dos benditos
Devasta um hoje como ontem, os fatos
Dos velhos novos empaletolados
Dos frios retratos pintados.
Que perdem suas cores
Perdem-se o algor dos licores
Escorre no ralo do segundo
Acabou-se o mundo?
“Bahia Submersa"
Do alto eu vi, estava esfacelada
Ensanguentando o mar, aguando o padecer
Um dia atrás de um dia, o tempo e as traças à roer
Os restos de uma Bahia, de tão triste, malograda.
De tão dessemelhante, estraçalha-lhe a identidade
De amanhecer tão penosa, amanhece abissal
Nesse presente subalterno, evaporou-se o carnaval
Arrancam-te olhos para não mais poder enxergar cidade.
Pagam a língua com o medo
Ínguas políticas minguando degredo
Correm as larvas e os loucos no vácuo da boca.
Pragmático sistema do engano ledo
Não mais um futuro
Escorrem enchentes humanas em profanas mentes ocas.
“O Olho e a Tinta"
dois corpos deitados no chão.
nus, quentes
feito cadáveres monstrengos japoneses
de filmes cult.
o amor é um filme cult.
é cinema de arte vanguarda jogada no lixo
da indústria.
o amor é a indústria.
é a dor sociológica que paira as cabeças
que fluem o engarrafamento mor das nossas dores
e enquanto o dilema evapora,
mais um corte.
meu amor parou na zona norte.
deu teto preto
e todas as cores
e todos os erros
e até parece que a coisa é a mesma.
dois corpos deitados no chão.
traçados, pintados
como num cenário pós apocalíptico - apenas a aurora dos dias
espalhada, a tinta pelo quarto.
e já não há mais distinção
sobre o que é vermelho ou azul.
já não há mais direção
do que é arte e o que é sentido
do que é realidade.
em um choque colorido,
tudo é mágico,
no tocar dos limites, tudo é mágico,
tudo é plástico, tudo é trágico
e se desfaz no letárgico.
J.P Schwenck é um artista multimídia carioca nascido no ano N⁰ II do século XXI. Proveniente de uma geração hiperativa e explosiva, ele escreve desde os 12 e produz conteúdo independente e efusivamente. Em 2020, publicou “Opus”, seu primeiro livro por si próprio e lançou seu podcast experimental "Alma Mastigada". Inspirado na arte contemporânea e no seu cotidiano, sua missão é expor a sua visão do mundo que lhe absorve e transpor sua liberdade artística.