3 poemas de Kleber Lima
1.
Eu apreciaria colocar minha cabeça para fora da janela e, por um momento, sentir o vento forte extraviando meus cabelos e bochechas.
Ao invés disso enfio a cabeça no meio das palavras - abrigo barato de beira de estrada - no qual posso esquecer a angústia por não menos do que nada.
Invisto todas as minhas forças neste poema que me recebe como se fosse a boca de um jacaré sedado que a qualquer momento pode despertar e me mastigar como se eu fosse um biscoito de sal.
Invisto todas as minhas forças neste poema como quem vasculha o bolso molhado da camisa em busca de um pedaço de papel onde havia anotado um endereço importante.
É tão simples perder a cabeça e não mais encontrá-la.
É tão simples ficar à deriva e agarrar dois esboços de mãos.
Esse é um poema que percorre milhares de quilômetros e não sai das minhas mãos, esse é um poema que vai até o mais alto e não passa da minha cabeça, esse é um poema que vai até onde ninguém vai e é onde estou.
–––
2.
Quando minha angústia nasceu
dava quase nada por ela.
Foi crescendo à revelia
como uma daninha
num vaso de jasmim.
Não sentia,
suas lâminas por dentro
dando luz
à miúdas fatias de areia.
Só bem depois,
(quando já se tem
que dar por si)
é que dei por ela.
Não havendo saída
a não ser través
de suas potentes garras
à deriva na cava:
enquanto
não termino
a contagem das estrelas
enquanto
ando por aí
com essa plantação
de asas pesadas
nas costas -
sem nenhum valor
para o país
sem nenhum valor
para a humanidade.
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3.
Depois de despejado é que comecei a adentrar a casa.
E indo cada vez mais dentro, largo e comprido era pra fora.
A total escuridão brilhava como nunca nenhuma luz.
Quando ancorado, eu saía para todos os lugares.
Quando esgotado, minha fonte só enchia.
Os calços que se punham ao pé das vitórias
eram de maciços fracassos.
E de tudo o que de mais lindo escutava
era dito por um boca muda
que de vez em quando se abria.
Meu próprio coração me devorava
e com metade do que me restava
já não dava conta da imensidão que me abrangia.
Kleber Lima. Teresina (PI). 1984.
Imagem: Gustave Doré – Ruggiero rescuing Angelica (Detail)